Releituras às Palestras de 1972 e 73 da TJIA à Luz das Manifestações Filosóficas de MANUEL REIS em seu TRÊS LIBRETOS
A pessoa que somos está diante de si mesma sem perceber o que é tão intrigada está com “…um fado que só ao cosmo pertence. E assim o foi, assim o é em seu ´processo civilizatório em curso´ (pcec)”, como escreveu o poeta J. C. Macedo em texto de abertura para a palestra “Nós E O Que Nos Rodeia De Tão Desconhecido. Ou: A Ignorância Que Alimentamos Ao Não Reconhecer A Maternidade Cósmica”, proferida clandestinamente por Hanne Liffey em Braga e Guimarães (Portugal) e Vigo (Galícia), em 1972, no âmbito do grupo Turma de Jovens Intelectuais Anarquistas (tjia).
Naquela época de tanta falta de liberdade na Península Ibérica (salazarismo e franquismo como pontas de uma falsa neutralidade autocrática), a juventude ibérico-galega construiu pontes filosóficas através da dramaturgia, da poesia e do cineclubismo, com jovens da França e da Irlanda, e a então estudante de medicina Hanne Liffey teve um papel importante pelo conhecimento que tinha da língua portuguesa e da sua relação com a professora Maria Augusta de Castro e Souza, fundadora da TJIA.
A pessoa-sapiens corrompeu-se socialmente na sua aventura clã-corporativa ou a hostilidade do ambiente telúrico-cósmico obrigou-a a um esforço anti-civilizacional para se impor àquele ambiente hostil? Este foi o tema central da palestra de Hanne Liffey, com sinopse mimeografada na casa de Maria Augusta, em São Torcato (Guimarães), uma quinta que sediou as atividades da TJIA. Lembrar esses momentos de combate à autocracia policialesca que agredia as sociedades ibéricas, hoje, na leitura de Três Libretos, do filósofo Manuel Reis, é dizer, e o digo com todas as letras, que o processo civilizatório em curso, que julgamos avançado em 1972/73, está em vigor 50 anos depois, porque no alvorecer de 2023 a questão é a mesma, e não apenas na Península Ibérica, em todas as sociedades.
E o que isto significa?, que a pessoa é sapiens e é sapiens-sapiens apenas pela abordagem da sobrevivência, não pelo esforço filosófico de ser-estar pessoa no âmbito da justiça social que permite a liberdade em humanismo crítico. Ora, a lição de Manuel Reis em Três Libretos é simples e responde a tudo: estamos longe de uma praxe vivencial em humanismo crítico. E sim, por outras palavras, tanto Maria Augusta quanto Hanne já diziam isso mesmo meio século antes (e a verdade é que também Reis já o dizia/escrevia e sofreu nas garras salazaristas).
Acredito, como pessoa que se lê e lê o mundo (o humano e o cósmico) que a circunstância inóspita do berço telúrico impôs atos extremos à pessoa sapiens, e que ela precisou de fabricar a circunstância esotérica para ter um cajado psicológico da (sua) ignorância: digo eu, tornou-se a cortesã de si mesma em estupro filosófico a garantir até um autocrático ´sangue´-azul para governança do clã-tribo que logo tornou-se cidade e império.
Nesta hora que vivenciamos o patamar filosófico-científico da pessoa sapiens-sapiens cabe questionar: e daí?! Continuamos tão “ignorantes como antes, porque vivemos a coisa material e não a força cerebral”, como diz a médica e poeta Johanne, filha de Hanne; sim, acreditamos que a fabricar divindades no reflexo do espelho alcançaremos algo melhor sem ainda sabermos o que é ser. Por isso, eis que estamos por estar…!